Edson Rontani Júnior –
Houve vida. Houve morte, também. Houve vida e morte antes e após o de 9 de julho de 1932. O 28 de maio daquele ano foi um dos estopins. A data é considerada hoje o Dia da Juventude Constitucionalista, dia em que forças solidárias a Getúlio Vargas são encurraladas na praça da República, capital paulista, atirando contra a multidão e matando imediatamente aqueles que formariam o acrônimo M.M.D.C., em lembrança a Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo. Alavarenga viria a formar o M.M.D.C.A. – sigla reconhecida décadas posteriores – por ter sido atingindo na mesma data, mas falecendo em agosto seguinte.
Nós, piracicabanos, tivemos nosso fatídico 9 de julho.
A data era 16 de julho de 1932. O relógio marcava 13 horas. O local era a praça 7 de setembro (atual praça José Bonifácio), proximidades da rua São José. Estava montado o cenário. A cidade compunha, assim, o 1º. Batalhão Piracicabano que partiu para Quitaúna na capital paulista (hoje cidade de Osasco). Foi assim que Piracicaba engajou-se na Revolução Constitucionalista cujo levante se deu em 9 de julho de 1932, ou seja, 91 anos atrás. Foram 200 membros que se apresentaram naquela ocasião.
Exatamente neste local foi que se inscreveram os primeiros voluntários conclamados na reunião realizada em 12 de julho, à tarde, no Teatro Santo Estevão, tendo como líderes do encontro Francisco Lagreca, Alberto Vollet Sachs, Luiz Dias Gonzaga, Sebastião Nogueira Lima, Nelson Camponez de Oliveira, Mário Neme, Haldumont Nobre Ferraz, Moacyr Amaral Santos entre outros.
Também denominado pela imprensa como 1º. Batalhão de Piracicaba ou Batalhão Noiva da Colina, este contingente era comandado pelo tenente do Exército Augusto Gomes, responsável pelo Tiro de Guerra 542. No campo de Batalha nossos conterrâneos eram liderados pelo 2º. sargento Juvenal Fernandes de Oliveira e pelo capitão Boaventura.
A história mais conhecida é que estes voluntários partiram da praça 7 de setembro marchando pela rua Boa Morte, recebendo pétalas de rosas atiradas pelos populares, acompanhados das bandas União Operária e Capitão Lorena. A Banda União seguiu com os voluntários pelo trem da Paulista até a capital paulista.
Diariamente partiam os voluntários. Relatos posteriores dos participantes dizem que 600 pessoas (entre homens e mulheres) se alistaram. Nos jornais, o prefeito Luiz Dias Gonzaga escreveu cartas abertas, dizendo que Piracicaba havia mandando 1 mil voluntários. Próximo ao final do conflito, o mesmo disse que havia enviado 3.500 e que, se preciso, enviaria mais.
As listas de inscrições foram feitas de forma descentralizadas. Jornais de época traziam nomes, dias e horários de embarques, mas não são fontes fidedignas para afirmações históricas, uma vez que muitos se inscreveram nas centrais de outras cidades. O voluntariado era feito por idealismo, embora registros mostram que muitos foram à batalha na intenção de se encaixarem em empregos prometidos caso São Paulo vencesse as forças federais de Getúlio Vargas. A maioria ficou a ver navios …
Os piracicabanos foram agrupados no 14º Regimento de Infantaria, 4º. Batalhão de Caçadores da Reserva, 5º e 6º. Regimentos de Infantaria, 2º. Batalhão dos Funcionários Públicos, Exército Constitucionalista dos setores Leste e Norte e outras divisões. Atuaram em Bocaina, Areias, Silveiras, Queluz, Itapira, Cruzeiro, Vale do Paraíba e áreas situadas no norte do estado.
A primeira baixa que o Batalhão Piracicabano teve foi com Ennes Silveira Melo, então com 26 anos, falecendo em 17 de agosto de 1932 no Hospital do Sangue em Cruzeiro. Ele e mais três companheiros foram alvejados por metralhadoras quando construíram um abrigo antiaéreo numa trincheira.
Os piracicabanos receberam das forças federais a alcunha de “Columna Maldita” pelas atrocidades cometidas. As mesmas eram negadas por nossos conterrâneos, os quais alegavam que tudo não passava de ‘fake news” com objetivo de abalar o moral da tropa.
Muitos relatos dos campos de batalha eram feitos por correspondência. Os jornais locais também tinham seus informantes, voluntários que atuavam como fonte de notícias: Mário Neme (“O Momento”), Jacob Dihel Neto, Pedro Krähenbühl (O Momento) e Antonio Moraes Sampaio (Jornal de Piracicaba).
A Revolução Constitucionalista terminou em 2 de outubro de 1932. A cobertura dos jornais se deu por mais dois ou três dias, existindo uma grande lacuna no retorno aos piracicabanos à sua terra. Motivo: Getúlio Vargas impusera a censura à imprensa e deportou para Portugal os líderes do movimento. A cidade volta, então, à sua normalidade.
Dia após dias, os noticiários trazem uma ou outra notícia – curta – sobre o retorno dos voluntários. Conforme o temor pela repressão desaparece, a mídia passa a valorizar seus voluntários, até que em meados de 1933 tomam destaques dos cadernos impressos dos jornais algumas atividades em alusão aos falecidos nesta guerra civil, com missa pelo primeiro ano de falecimento. E assim se escreve a história…
Piracicaba, 18/07/2023
Edson Rontani Júnior
É jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba