A ocupação da orla do rio e o respeito à natureza
A ocupação da orla do rio e o respeito à natureza

A ocupação da orla do rio e o respeito à natureza

Desde muito jovem, me preocupou o fato de as margens dos rios serem os locais preferidos para a instalação de indústrias ou outras formas de ocupação que não se harmonizam com a natureza da orla ribeirinha. Nos passeios pelo saudoso e delicioso Parque do Mirante, a visão sentia-se incomodada com o contraste entre a maravilhosa cachoeira a espalhar a aconchegante neblina nas árvores e nos mirantes espalhados pelo parque e uma fábrica com suas chaminés quebrando a harmonia da natureza na outra margem do rio.

Da mesma forma, quando freqüentávamos o Regatas e nos sentávamos a margem a apreciar o rio, a visão da enormidade dos barracões do Engenho Central na outra margem, com sua enorme chaminé, produzindo açúcar e álcool, rompendo bruscamente o belíssimo panorama constituído pelas águas em queda cercadas pelo verde do parque do mirante, que se estendia por detrás do engenho e na continuidade da margem após os barracões, rio abaixo.

Outras usinas também buscavam as margens do rio para se instalarem, como foi a Monte Alegre, a Costa Pinto (que ainda está lá), a Tamandupá, entre outras. Depois de entender melhor a ânsia do capitalismo pelo lucro, buscado com avidez por todo empreendimento produtivo, dá para compreender melhor o porque dessas ocupações. O primeiro fator a criar facilidades para os empreendedores, era o descarte dos resíduos diretamente no rio, sem nenhuma preocupação com tratamento e busca de locais adequados para sua disposição. Outro fator importante era a possibilidade de utilização da água do rio, retirada através de bombas ou com a construção de desvios particulares para abastecimento próprio e que o povo apelidou popularmente de “rego”. Quem não se lembra do “Rego da Fábrica” ou do “Rego do Engenho”?

Apesar da incômoda visão da natureza assim afetada, a consciência do povo ficava um tanto anestesiada pelos benefícios que as indústrias traziam com a grande geração de empregos, a produção que era vendida gerando tributos importantes para a vida da cidade. A poluição do rio só causou maior impacto e indignação quando as enormes mortandades de peixes ocorriam e as chocantes fotos nos jornais impressionavam a todos. A legislação ambiental veio muito tarde, criando as áreas de preservação permanente – APPs, para proteção dos mananciais, quando muita ocupação contrária à lei já estava completamente consolidada e não foi atingida por ela. A lei veio para preservar o que ainda restava da natureza. Felizmente o Engenho Central foi desativado e transformou-se num valioso patrimônio cultural para a cidade com a corajosa e histórica desapropriação pela Prefeitura.

A outra indústria situada na margem esquerda do nosso belo salto, também se encontra desativada há longo tempo, com o desaparecimento da Companhia Boyes e após, de forma absurdamente permitida, ser ocupada durante algum tempo por uma fundição.

Agora, os jornais da cidade noticiam que empreendedores apresentam projeto de ocupação daquela área para a construção de um conjunto de edifícios de elevada altura, contrastando totalmente com a natureza do local.

Lembro-me quando ainda exercia as atribuições de vereador e chegou na Câmara para aprovação legislativa, a proposta de construção de inúmeros edifícios de apartamentos, na antiga Chácara do Vevé, como era conhecida. Para discutir a questão e me posicionar contrário à proposta, utilizei um quadro com uma foto enorme do rio (retirada para dar lugar ao painel eletrônico e que não se sabe onde está hoje) que ficava na parede, por trás da mesa da presidência, no plenário. Tentei influenciar os colegas vereadores construindo uma imagem drástica do que seria quebrar a harmonia daquela foto com a construção de um verdadeiro “paliteiro” de prédios confrontantes com a majestosa mata da Chácara Nazaré e o parque da Rua do Porto. Não consegui convencê-los, e os referidos edifícios, hoje lá estão, porém guardo a gravação do meu pronunciamento para mostrar às minhas netas, como documento em defesa da harmonia ambiental na orla do nosso querido, e hoje moribundo, Rio Piracicaba.

Por Antonio Oswaldo Storel – membro do IHGP, ex-vereador (1997]2008), ex-presidente da Câmara Municipal.